Crónica da Corrida dos Triunfadores no Campo Pequeno
09 de Setembro de 2017 - 21:09h | Crónica por: Jorge Rebocho - Fonte: Taurodromo.com - Visto: 1904 |
Foi a 07 de setembro de 2017 que se realizou no Campo Pequeno a corrida dos triunfadores da presente época taurina. Com meia casa forte e uma noite quente, daquelas que dão vontade de ir aos toiros e, se no cartel tudo apontava para uma corrida plena de triunfos, na prática, esta foi como as demais, com altos e baixos, e com todas as incertezas que esta festa sempre nos brinda, para que a monotonia nunca seja seu apanágio, do esperado saiu o inesperado.
Do cartel de triunfadores fizeram parte: Luis Rouxinol para as lides a cavalo e Juan José Padilla e Manuel Dias Gomes para as lides a pé, as pegas estiveram a cargo do Grupo de Forcados Amadores de Santarém, os toiros para a lide a cavalo, vieram da herdade do Zambujal, com a divisa de Vinhas e da ganadaria de Manuel Veiga para as lides a pé.
Reiterado na história da tauromaquia, a idolatração, leva recorrentemente a finais menos felizes e a madrastas injustiças, o povo idolatra em exagero como depois com o mesmo exagero condena, a agravar este facto está ainda a genética do povo português que tem um profundo desprezo pelas regras e tende pelo seu reincidente incumprimento.
Pelo seu carisma, pela sua entrega, pelo coragem e valentia com que Padilha contornou a sua lesão que tão “marcado” o deixou, já merece só por si enorme reconhecimento, respeito e admiração mas não deixa de ser excessivo as vezes que foi anunciado em cartéis por terras lusas. Os constantes finais apoteóticos eram outro exagero e todo o aficionado que o não fosse ver onde atuasse era por si uma irresponsabilidade. Ontem em Lisboa provou o reverso da moeda.
Padilla esteve esforçado profissional e cumpriu com o que os toiros que teve pela frente lhe permitiram fazer, no 1º toiro, o cigano de 480kg preto bragado e de saída atípica “berrento” até ao exagero, nunca foi um toiro comodo de lidar, era bravo e bruto mas descomposto na investida. O matador recebeu-o com rigor no capote, bandarilhou com muito acerto para gáudio do público e na muleta fez o que pode, teve algumas sequências felizes e passes de muito acerto, variou as sortes e teve desplante, ouviu silêncio.
Na sua 2ª lide cabe a reflexão que anteriormente fizemos, o toiro saiu bonito e vistoso, o Cancelito, com 510 kg, de cara alta, astinegro, bem armado, mas mal visto, facto denunciado logo nos primeiros capotazos, o que fez com que Padilha cedesse a função de bandarilhar à sua quadrilha, o que revoltou, e de que maneira o publico presente, sem razão nenhuma, pois é um direito do matador decidir quem bandarilha, se os protestos se deviam à substituição do toiro pelo sobrero? Fazem ainda menos sentido pois o toiro já estava bandarilhado no início dos protestos, e não pode recolher aos curros. Bem o director de corrida a não acatar a opinião do publico, os apupos e as vaias caíram no exagero de continuarem mesmo quando o matador de toiros já abandonava a praça no final do espectáculo, facto lamentável.
A lide em si pouca história teve, o Cancelito nunca foi fácil, nunca foi franco, colheu a muleta por 3 vezes, metia a cara descomposta e para ajudar o desacerto da lide, foi concedida música, foi cancelada música, enfim, um manancial de desacertos onde o protagonista mais confuso foi sempre o público.
O triunfador da noite foi sem sombra de dúvida o matador de toiros Manuel Dias Gomes, pela vontade, pela entrega e por não se intimidar minimamente em repartir cartel com um toureiro espanhol que tem indiscutivelmente outra “rodagem” .
No seu 1º toiro, um harmonioso castanho olho de perdiz, com 504kg de peso, teve pela frente um inspirado matador, pautado pela elegância e temple, evidenciou muita plasticidade e toreria, quando as lides lhe correm de feição estas características evidenciam-se.
Nas bandarilhas a sua quadrilha esteve irrepreensível, muito ajustados e o público reconheceu este facto. Na muleta o “olho de perdiz” não foi tão colaborante, percebeu que a muleta era um engano e ao 3º passo da sequência já saia descomposto virando costas à luta, o toureiro foi sempre contrariando estas intenções e fez uma lide bem positiva.
No seu 2º toiro, foi a par da segunda de Luis Rouxinol a lide da noite, frente ao primavera, preto, berrento e bonito como os irmãos de camada. A lide foi limpa em todos os quites, bem recebido no capote, com elegância e acerto, irrepreensivelmente bandarilhado. Na muleta o Primavera foi recebido de joelhos, e humilhou por ambos os pitons. O matador pressentiu a oportunidade e recriou-se, fez os passes que quis e soube, teve desplante, arriscou, provou ao sabor da colhida por duas vezes, felizmente sem consequências, e nem por isso se diminui e encerrou a sua prestação no campo pequeno com uma grande lide, se era a noite dos triunfadores, esta foi sem dúvida uma noite de triunfo para Manuel Dias Gomes que bem merece mais oportunidades.
Luis Rouxinol provou as duas faces da moeda, toureou 2 Vinhas de comportamento distinto, ainda que de capa e morfologia semelhantes. O 1º, com 580 kg e muito em tipo dos santacoloma era cardeno estrelado, cornicurto e de pouca cara. Nos compridos ainda prometeu alguma codicia e o Luis Rouxinol cravou dois bons ferros compridos em curto. Nos curtos já o astado tinha aprendido a lição e sabia o que fazer para colher. Mostrou-se sempre reservado, demorado e quando arrancava colhia, sempre pela certa, o cavaleiro bem tentou castigar e esforçar a montada que já tinha percebido a dificuldade do oponente. Trocou para uma montada com menos instinto e mais voluntariosa mas fez o que pode com ferros de recurso. Este toiro teve o mérito de estar sempre por cima de um toureiro que dá a volta a qualquer toiro. Entendeu por bem não dar volta à praça.
No seu 2º, com 550kg, já tivemos o Luis Rouxinol que nos acostumamos a ver. Nos compridos entrou pelo toiro a dentro, vinha com ganas e rematou as sortes com os ladeios que o público tanto gosta e os prefere à verdade do ferro. Nos curtos o acerto foi igual e ao primeiro curto já lhe era concedida a música que nunca ouviu no primeiro toiro. Seguiram-se mais 3 curtos, 2 ferros de palmo e um par de bandarilhas muito bem executados, com montadas que são por si só um espectáculo digno de ser visto. Nesta lide apenas faltou um pouco de aprumo nos pormenores de equitação, que o estilo emotivo deste cavaleiro por vezes relegam para segundo plano.
No capítulo das pegas, os Amadores de Santarém tiveram uma noite limpa nos dois toiros de vinhas. Os toiros foram colaborantes, foram sempre pelo seu caminho e não complicaram a vida aos forcados, apesar de chegarem à pega ainda com pulmão e força o que pedia peso nas ajudas. Foram caras o António Campino e o Francisco Granciosa, que pegaram ambos à primeira tentativa e com o grupo lá bem atrás a dar vantagens.
No início do espectáculo guardou-se um minuto de silêncio em memória do matador de toiros Dámazo Gonzalez e do forcado Pedro Primo dos Amadores de Cuba, que precocemente nos deixou e que demonstra bem os perigos que toureiros e forcados se expõem e que é muitas vezes subvalorizado.
Foi director de corrida o Sr. Manuel Gama, assessorado pelo Dr. Jorge Moreira da silva.
Ainda uma última nota digna de alguma reflexão aos aficionados que estiveram na última corrida do Campo Pequeno, claro que esta advertência não generaliza quem lá esteve mas boa parte do público que tão veementemente condenaram, de forma injusta, Juan José Padilla, foram também o mesmo público que no final do espétaculo viraram costa às duas merecidas voltas concedidas a Manuel dias Gomes para chegar 10 minutos mais cedo a casa. É tão fácil exigir dos outros quando a nós nada exigimos.
Jorge Rebocho